Em mais um sinal do recuo da Comissão Europeia presidida por Ursula von der Leyen na chamada “agenda verde” da UE, o seu porta-voz Maciej Berestecki anunciou na sexta-feira que a Comissão “pretende retirar a proposta das Alegações Verdes”. Esta diretiva introduzida em março de 2023 visa combater a desinformação que as empresas praticam ao anunciar os seus produtos como amigos do ambiente. Estudos demonstram que mais de metade dessas alegações são vagas ou enganadoras e 40% são têm qualquer sustentação. A esta publicidade e ações de comunicação das marcas para se apresentaram como amigas do ambiente deu-se o nome de “greenwashing”.
UE: a Comissão deixa de lado a sua própria Agenda Verde
Ludovic Lamant e Jade Lindgaard
A proposta inicial obrigava as empresas a assegurar a veracidade das suas alegações através da verificação por entidades independentes apoiadas em provas científicas. A proliferação dos selos de qualidade ambiental criados pelas empresas também estava na mira da proposta, obrigando à sua verificação independente e revisão periódica e só permitindo novas etiquetas a nível europeu e caso mostrem maior ambição ambiental do que as já existentes.
A diretiva teve a oposição da direita e da extrema-direita, com o PPE (onde se integram PSD, CDS e a própria von der Leyen) a apelar à retirada da proposta, alegando que ela contraria o esforço de combate à burocracia ao criar novas regras para as empresas e que não está provado que os seus benefícios compensem os custos e incertezas regulatórias. A extrema-direita dos grupos dos Conservadores e Reformistas da Europa (ECR) e dos Patriotas pela Europa, de Le Pen, Orbán e Ventura, aplaudiram o anúncio da retirada da diretiva.
Este anúncio do recuo enfureceu os grupos socialista e liberal, que tinham dado apoio à comissão von der Leyen e ameaçam agora retirar esse apoio caso a lei seja retirada. Segundo o portal Politico, os dois grupos acusam von der Leyen de alinhar com a extrema-direita que pretende enterrar todas as propostas ambientais da Comissão, ao mesmo tempo que ignora a posição dos grupos de que depende para fazer passar as suas propostas, após ter sido firmado em novembro um acordo de cooperação entre o PPE, Socialistas e Liberais.
Em declarações ao Euractiv, já depois destas críticas, uma fonte da Comissão veio sinalizar um novo recuo em relação às declarações públicas de sexta-feira, afirmando que a diretiva continuará em negociação no trílogo - Comissão, Parlamento e Conselho -, mas que o preço a pagar será abrir uma exceção para as microempresas no cumprimento desta diretiva. Outra fonte ligada ao Conselho mostrou-se surpreendida com esta informação, pois a questão das microempresas já tinha sido acordada na reunião dos embaixadores na passada quarta-feira.
Entrevista
Manon Aubry: “Existe uma coligação já estruturada da direita e da extrema-direita”
Direita e extrema-direita juntam-se para controlar financiamento das ONG e chumbar fiscalização aos lóbistas
Além do plano ambiental, as alianças entre a direita e a extrema-direita estenderam-se também na semana passada ao controlo sobre as atividades das ONG, com a aprovação de um grupo de trabalho para avaliar o seu financiamento.
Em comunicado, a co-presidente do grupo parlamentar da Esquerda, Manon Aubry, sublinhou que a maioria que aprovou este novo grupo de trabalho foi a mesma que chumbou a constituição de um organismo europeu de ética que monitorizasse os lóbis e os fundos destinados aos eurodeputados, de forma a prevenir casos como o Qatargate, Huawei ou Pfizer. “O objetivo é claro: intensificar o ataque à sociedade civil, privá-la de financiamento e impedi-la de criticar os governos. Os Estados sem uma sociedade civil independente têm um nome: regimes autoritários”, afirmou Manon Aubry.