As eleições para a Ordem dos Médicos, antecipadas em quase um ano por causa da entrada em vigor do novo Estatuto, decorreram quase sem surpresa com a reeleição do bastonário Carlos Cortes e dos presidentes dos conselhos regionais do Centro, Manuel Teixeira Veríssimo, e do Sul, Paulo Simões, todos a apresentarem-se em listas únicas. A exceção ocorreu na secção Norte, onde as polémicas que envolveram o médico, empresário e antigo governante do PSD, Eurico Castro Alves, acabaram por lhe valer a derrota face à lista encabeçada por um dos seus maiores críticos em público, o alergologista José Torres da Costa, por 4.968 votos contra 4225.
Saúde
Eurico Castro Alves, sombra de ministra, “o melhor de dois mundos” na Saúde
porLuís Branco
Enquanto ocupou o cargo de líder da Secção Regional Norte da Ordem dos Médicos, Eurico Castro Alves foi anfitrião das férias de Luís Montenegro na sua casa no litoral brasileiro e convidado pelo Governo para criar o chamado “plano de emergência” para o SNS. Foi a tomada de posição pública de um grupo de médicos, encabeçada pelo novo presidente da Secção Regional Norte da Ordem dos Médicos, contestando o conflito de interesses da presença de Castro Alves na comissão de avaliação do “plano de emergência” que coordenou, que levou este último a afastar-se daquele cargo para o qual tinha sido indicado pela Ordem dos Médicos.
Da sua lista vencedora em 2023 fizeram parte uma mão cheia de nomeados para altos cargos com responsabilidade na Saúde pelo atual Governo, a começar pelo próprio Eurico e pela Secretária de Estado da Saúde, Ana Povo, que com ele trabalhou e lhe sucedera à frente do Centro Académico Clínico do ICBAS. Também Alberto Caldas Afonso, companheiro de lista e seu orientador de tese de doutoramento foi nomeado para a comissão que preparou o “plano de emergência” e depois para a Comissão Nacional da Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente. Outro nome da lista à OM Norte, entretanto caído em desgraça, foi o de António Gandra d’Almeida, nomeado diretor-executivo do SNS, cargo que deixou de ocupar na sequência do escândalo sobre acumulação de cargos como diretor do INEM Norte e tarefeiro em vários hospitais do país. O quinto nome da lista que venceu a eleição de 2023 na OM Norte viria a ser nomeado mais tarde: trata-se do médico António Maia Gonçalves, atual coordenador do Plano de Ação de Envelhecimento Ativo e Saudável.
Saúde
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porLuís Branco
Além da nomeação dos elementos da sua lista para cargos de responsabilidade, Eurico Castro Alves também tem uma proximidade antiga com a ministra Ana Paula Martins. Chegou a contratá-la enquanto bastonária da Ordem dos farmacêuticos para dar formação sobre canábis medicinal num curso dado por uma das suas empresas e tiveram uma conta bancária conjunta com o então líder da Ordem dos Médicos Miguel Guimarães, com a finalidade de gerir um fundo solidário financiado pelas farmacêuticas durante a pandemia para distribuição de material hospitalar.
A par da atividade de médico no Hospital de Santo António, Eurico Castro Alves desenvolveu também atividade privada no ramo da saúde e da canábis medicinal. Durante o boom deste negócio, foi muito procurado enquanto consultor pelos investidores que queriam beneficiar da sua experiência enquanto antigo presidente do Infarmed para conseguirem as certificações necessárias a esta atividade legalizada em 2018. O seu mais recente projeto, de que falou ao Esquerda.net com entusiasmo em novembro passado, é o da criação de uma rede mutualista de seguros de saúde ao estilo da ADSE para os trabalhadores do setor privado, com uma estratégia que prometia ser “disruptiva” do mercado. Eurico Castro Alves negava qualquer incompatibilidade sobre definir políticas para o SNS e incentivar os seguros privados, defendendo que “há coisas que tem de ser o SNS a fazer, mas há outras coisas que podem ser feitas no setor social ou privado”.