Habitação

Governo espanhol quer limitar compra de casas por não‑residentes

14 de janeiro 2025 - 12:54

Entre as doze medidas apresentadas por Pedro Sánchez está o aumento da taxação sobre a compra de casas por não-residentes e o alojamento local. Esquerda diz que medidas são insuficientes e exige intervenção no mercado para baixar preços das rendas.

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Pedro Sánchez na apresentação do novo pacote de medidas para a habitação.
Pedro Sánchez na apresentação do novo pacote de medidas para a habitação. Foto Pool Moncloa/Fernando Calvo y Borja Puig de la Bellacasa

O agravamento da crise na habitação em Espanha tem sido tema de debate político e nos últimos dias o PP e o Governo apresentaram as suas propostas. Embora o diagnóstico seja em grande medida semelhante, algumas propostas vão em sentidos diferentes. Do lado do Governo, Pedro Sánchez deu a conhecer doze propostas, onde se destaca a criação de uma nova empresa pública de habitação, para a qual serão transferidas as casas que pertencem ao Estado - apenas 2,5% do parque habitacional - e dois milhões de metros quadrados de terrenos urbanizáveis e destinados a casas de renda acessível. Estas casas verão a sua propriedade pública blindada na lei, com a promessa de evitar a venda de habitação pública a fundos imobiliários, como aconteceu no passado. As propostas incluem também benefícios fiscais para os senhorios que arrendem casas ao preço do índice de referência, ficando isentos de imposto sobre as rendas. O alojamento local será considerado um negócio e tributado como tal, incluindo através do IVA em zonas de maior tensão no mercado imobiliário.

Sánchez promete também aumentar até 100% o imposto pago pela compra de casas por parte de não-residentes extracomunitários, para tentar travar a subida de preços originada por esta procura com poder de compra muito acima dos trabalhadores espanhóis. Por seu lado, o PP não acompanha esta medida, embora o seu líder Alberto Feijóo tenha dito, horas antes de ela ser apresentada pelo primeiro-ministro, que um dos maiores problemas da habitação em Madrid era o facto de os latino-americanos com “rendimentos elevados” estarem a dominar o mercado imobiliário.  

A direita tinha apresentado o seu plano na véspera, após reunirem todo o fim de semana para elaborarem um pacote de medidas alternativo ao do Governo do PSOE/Sumar. Com boa parte das competências na política de habitação a pertencerem às comunidades autónomas, na maioria lideradas pelo PP e que se recusam a aplicar as tímidas medidas previstas na atual Lei da Habitação, o encontro serviu para acordarem dez medidas a aplicar nessas comunidades governadas pela direita. Elas passam pelo alargamento até aos 40 anos de idade dos avais públicos aos 20% do preço não incluídos nos empréstimos bancários, diversos benefícios fiscais para compradores e senhorios e propostas para acabar com barreiras administrativas à construção e desregulamentação da política de solos para aumentar a construção. Medidas que depressa foram classificadas pelos socialistas como um regresso às políticas que conduziram à bolha especulativa imobiliária que rebentou em 2008

Do lado do Sumar, o parceiro de governo dos socialistas, vieram elogios à mudança de discurso do primeiro-ministro e o reconhecimento de que é preciso “ir mais além” para tornar efetivas as medidas. No pacote anunciado por Sánchez estão propostas do partido liderado por Yolanda Díaz, como a tributação do alojamento local com IVA ou o fim das vendas das casas do Sareb - o “banco mau” que gere ativos da banca nacionalizada após a crise financeira - para as incorporar no parque público de habitação. O porta-voz do Sumar e ministro da Cultura, Ernest Ursasun, deixou críticas a medidas como os benefícios fiscais aos senhorios ou à proposta de alterar a lei dos solos. E desafiou o Governo a avançar com medidas para impedir a compra de casas para uso especulativo, fazer depender os fundos para habitação da aplicação do controlo de rendas por parte das comunidades autónomas, entre outras medidas.
 

Esquerda acusa Sánchez de multiplicar anúncios sem ir à raiz do problema 

À esquerda da coligação de Governo não faltaram críticas ao plano agora apresentado por Pedro Sánchez. O Podemos diz que as medidas anunciadas são mais um exemplo do vazio de propostas ante a emergência no setor da habitação. E ameaça não dar o seu voto a favor do próximo Orçamento caso este não inclua medidas como a redução em 40% do preço das rendas, a expropriação do uso de metade dos prédios nas mãos dos fundos de investimento, a proibição da compra e venda de casas que não seja para uso residencial, ou a ilegalização de “pseudoempresas” como a Desokupa, que se dedica a expulsar pela força e assédio inquilinos sem alternativa habitacional.

“O Governo está a brincar com o fogo em matéria de habitação e vai acabar por se queimar. As pessoas não aguentam mais esta situação”, afirmou Pablo Fernández. Para o co-porta-voz do Podemos, ao contrário do que sustentam o PSOE e o PP, o problema em Espanha não é a falta de casas, pois estima-se que haja 3,8 milhões de casas vazias. Daí a sua aposta na expropriação em vez de “contribuir para a especulação”.

Outros dois partidos da esquerda necessários à viabilização do Orçamento - e da continuidade do atual governo PSOE/Sumar - também apelidaram de insuficientes as medidas anunciadas pelo primeiro-ministro. “Chegam tarde e ficam aquém” do necessário, considerou o líder parlamentar da Esquerda Republicana da Catalunha. Para Gabriel Rufián, o executivo devia ter como regra que acima do direito a enriquecer dos grandes senhorios está “o direito de alguém ter uma habitação digna”.

Por seu lado, o porta-voz económico da esquerda independentista basca do Bildu, Oskar Matute, criticou também a medida fiscal para encarecer a compra de casa por não-residentes, afirmando que “limitar não é suficiente” e o que é preciso é “proibir a compra de casas por estrangeiros que não sejam para lá viverem”, o mesmo acontecendo aos fundos que compram centenas de imóveis para especular. “É simples e de senso comum: as casas são para viver, não para especular”, afirmou Matute.