Um deputado do Fidesz, o partido do primeiro-ministro Viktor Órban, apresentou esta terça-feira no Parlamento um projeto de lei para criar “um registo de organizações que ameaçam a soberania da Hungria com ajuda do estrangeiro”. A inspiração da iniciativa de Janos Halasz é a “lei dos agentes estrangeiros” que Vladimir Putin fez aprovar na Rússia em 2012 para reprimir as ONG e media independentes.
Com o financiamento público à suas atividades cortado pelo regime de Órban, a maioria das ONG e media independentes que ainda desenvolvem trabalho na Hungria depende do financiamento de fundos europeus, donativos de instituições internacionais ou do apoio de cidadãos húngaros a viver no estrangeiro.
Em apoio à proposta do deputado do Fidesz, o governo húngaro argumentou, segundo o diário francês Le Monde, que “milhões de dólares, vindos sobretudo de entidades americanas e bruxelenses, têm sido encaminhados par grupos da sociedade civil e meios de comunicação (…) com o objetivo de manipular o sentimento dos eleitores em função de interesses externo”. A proposta vem em linha com as últimas ameaças de Órban, nomeadamente num discurso em março em que prometeu uma “limpeza de primavera”, por entre críticas aos media, aos juízes e à oposição em geral.
A tradução prática da medida, além de obrigar as organizações colocadas na lista de “agentes estrangeiros” a pedir uma autorização ao governo antes de receberem financiamento do estrangeiro, retira aos cidadãos húngaros que façam donativos a essas organizações a possibilidade de beneficiarem de dedução fiscal. Os dirigentes dessas organizações terão de entregar declarações de património semelhantes às dos titulares de cargos políticos, que serão do domínio público.
As críticas à proposta não demoraram a surgir, com a maior associação de defesa dos direitos cívicos, a Tasz, a prometer que “o governo pode obrigar-nos a passar à clandestinidade, mas não pode retirar-nos o empenho e a fé com que protegemos os direitos dos húngaros”. Também a Federação Internacional de Jornalistas condenou a proposta e apelou à União Europeia para aplicar sanções em resposta a este novo ataque ao Estado de Direito. O presidente da Câmara de Budapeste, Gergely Karacsony, diz que “o governo está a tentar em vão transformar o nosso país na Rússia”. A anunciada proibição da Marcha do Orgulho LGBT já fazia antever protestos nas ruas da capital nas próximas semanas, mas agora um antigo membro do Fidesz que se tornou deputado da oposição conhecido pela agenda anticorrupção, Akos Hadhazy, está a apelar aos húngaros para saírem à rua no dia 20 de maio “contra a putinização da Hungria”.
No início de 2025, a Hungria viu suspenso o financiamento de fundos europeus no valor de mil milhões de euros, verbas que se juntaram a outros 19 mil milhões já congelados devido a violações do Estado de Direito, problemas de corrupção, financiamento político, conflitos de interesses e independência da comunicação social.