Quénia

Milhares voltaram às ruas do Quénia. Mas a repressão também voltou

26 de junho 2025 - 14:30

As manifestações assinalavam o aniversário da grande mobilização protagonizada pela juventude, invocando as vítimas de então e as mais recentes. A polícia e grupos armados agiram contra os manifestantes e houve 16 mortos e 400 feridos.

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Protestos desta quarta-feira em Nairobi. Foto de DANIEL IRUNGU/EPA.
Protestos desta quarta-feira em Nairobi. Foto de DANIEL IRUNGU/EPA.

No Quénia, milhares de manifestantes voltaram às ruas esta quarta-feira. A mobilização assinalava o primeiro aniversário da onda de mobilizações massivas contra o aumento de impostos e o custo de vida que durou semanas e culminou com a invasão do Parlamento a 25 de junho, um movimento liderado pela juventude do país.

Durante esse processo de luta, pelo menos 60 pessoas foram mortas e mais de 80 estão desaparecidas desde então. Esta terça e quarta-feira há a lamentar novas mortes nas manifestações convocadas pela associação de familiares das vítimas das manifestações anteriores. 16 mortos e 400 feridos confirmados pela Comissão Nacional de Direitos Humanos do Quénia, instituição com financiamento governamental. Pelo menos 83 estarão em estado grave.

A RFI conta como em Nairobi, a capital do país, os manifestantes tentaram entrar no Central Business District, no coração da cidade, mas foram violentamente expulsos pela polícia com recurso a tiros, gás lacrimogéneo e canhões de água. Um dos manifestantes ouvido pela rádio francesa, Oumar, disse então: “A polícia provoca. Estávamos a manifestar-nos pacificamente e atiraram gás lacrimogéneo contra nós. Sem nenhuma razão. Pedimos aos polícias para parar. É injusto.” Depois disso, os manifestantes reagiram com pedras. Cenas de repressão idênticas foram relatadas noutras cidades cidades do país.

Vários grupos armados, com motociclos e em coordenação com polícia, também agiram violentamente contra os manifestantes. O mesmo tinha acontecido durante as manifestações do ano passado e na semana passada noutro protesto pacífico.

Um dos motes da manifestação era precisamente a denuncia da “brutalidade policial”, afirmou à AFP Anthony, de 25 anos. À Reuters, Fedrick Oduor fala no mesmo tema e refere a morte de um professor sob custódia policial no início do mês depois de ter criticado um chefe de polícia no seu blogue: “Estamos a protestar porque queremos justiça para [Alfred] Ojwang, justiça para todos aqueles que foram mortos pela brutalidade policial, é tudo o que pedimos. Exortamos o Governo a deixar-nos manifestar pacificamente em vez de nos expulsar com violência”.

Depois disso, Boniface Kariuki, um vendedor, foi morto pela polícia à queima-roupa num protesto por causa da morte de Ojwang. Não foi o único: Hussein Khalid, secretário-geral da ONG Vocal Africa, denuncia que mais de 20 pessoas foram assassinadas pela polícia só nas últimas semanas. Sobre as vítimas anteriores, apesar das promessas do governo, “nenhuma justiça foi feita, nenhum polícia foi preso. As famílias foram abandonadas sem nenhuma compensação. O sistema continua podre”.

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A presidente da Sociedade Legal do Quénia, Faith Odhiambo, salientou no X o “paradoxo infeliz” em que o país está: “enquanto as pessoas procuram justiça para as vidas já perdidas, mais vidas se perdem”, lamentando também ela a “brutalidade e excessos policiais”.

Os manifestantes insistem igualmente em referir como motivos dos protestos o desemprego, a corrupção, o custo de vida e os impostos altos e exigem a demissão do presidente William Ruto.

Por ordem governamental, a cobertura televisiva e radiofónica dos protestos foi suspensa. A emissão de vários canais foram mesmo suspensa. O acesso ao Telegram, por onde foram convocados os protestos e se comunicavam muitos manifestantes, foi restringido, avança a empresa de monitorização NetBlocks.