Pescadinha de rabo na boca. Onde está a valorização do trabalho nos cuidados?

porPedro Faria

22 de junho 2023 - 16:23
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As trabalhadoras e trabalhadores do setor social e dos cuidados exigem da Confederação das Instituições de Solidariedade, da União das Misericórdias, da União das Mutualidades e de todas as entidades patronais o aumento real dos salários e exigem que o Governo PS deixe de brincar com as suas vidas.

Muitos se lembram das longas palmas que se bateram às trabalhadoras e trabalhadores essenciais que no auge do Covid deixaram as suas famílias para cuidar dos nossos familiares.

Eis que nos encontramos a meio de 2023 e as promessas da mais que justa valorização destas trabalhadoras e trabalhadores continua sem concretização à vista.

Parecia claro termos chegado à conclusão coletiva que tão importante trabalho teria obrigatoriamente de sair dos insuficientes salários mínimos, que tal trabalho é especializado e deve ter formação contínua de qualidade que não é condizente com a ideia de alta rotatividade ou de trabalho temporário indiferenciado.

Sabemos que a demissão do estado neste sector, entregando estas respostas na totalidade às Instituições sem fins lucrativos, às instituições da Igreja, Mutualidades, Cooperativas e ao sector privado lucrativo, também se traduz no histórico subfinanciamento por parte do Estado dos protocolos das valências nas mãos das várias instituições sem fins lucrativos acima referidas, que na sua maioria são de 40% dos custos, comparticipando as famílias com 30%, cabendo às instituições arranjar os restantes 30%. Apesar do Estado já ter mostrado a vontade de se aproximar dos 50% do financiamento, a verdade é que tarda a concretizar-se.

Ora a situação de dependência deste setor do financiamento do Estado e a não assunção do Estado nas suas responsabilidades dos cuidados que deveria passar por um serviço nacional de cuidados garantidos para todas as pessoas que deles necessitem, deixa os trabalhadores no meio duma verdadeira “pescadinha de rabo na boca”. Os Sindicatos tentam negociar aumentos reais dos salários e melhoria das carreiras e condições de trabalho com as confederações e organizações patronais do setor, havendo o esforço de alguns dos sindicatos para que este sector se reja apenas pelo Contrato Coletivo de Trabalho das Instituições de Solidariedade Social de forma a beneficiar os trabalhadores e reduzir entropia no setor. As Organizações Patronais respondem aos Sindicatos que, apesar de acharem essencial a valorização salarial destas trabalhadoras e trabalhadores, não podem fazê-la, pois, invocam que o financiamento por parte do estado é insuficiente e que mesmo os ínfimos aumentos que não tiram estas trabalhadoras e trabalhadores da esfera do salário mínimo ou do risco que no próximo ano sejam apanhadas pelo salário mínimo, põe muitas das instituições em grave risco de falência, até porque a inflação afeta esta setor em mais de 20%.

Por outro lado, o Governo PS, afirma que já deu os aumentos de comparticipações necessários para que as instituições tenham trabalhadoras e trabalhadores abrangidas pela contratação coletiva dinâmica e aumentos dignos e que assim sendo a negociação do Governos com as confederações está por agora terminada e que assim sendo os aumentos serão responsabilidade das instituições.

Havendo sempre a dúvida neste caso se o elo mais fraco são as pessoas que precisam dos cuidados ou os trabalhadores que os prestam, uma coisa é certa neste jogo do empurra entre Instituições e Governo todos lavam as mãos, menos as trabalhadoras e trabalhadores que perderam no último ano mais de 20% dos rendimentos para o aumento do seu cabaz de compras (curiosamente a mesma ordem de número de aumento de custos de que as instituições se queixam). Fartos que as palmas não lhes paguem a renda, as compras, o transporte, as trabalhadoras e trabalhadores do setor social e dos cuidados exigem da Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade, da União das Misericórdias, da União das Mutualidades e de todas as suas entidades patronais o aumento real dos salários e exigem que o Governo PS deixe de brincar com as suas vidas e se lembre que aqui tem trabalhadoras e trabalhadores de alta qualidade, que cuidam dos mais vulneráveis, que têm de ser pagos condignamente e que deixem de ser tratados como caridosos voluntários à força, enredados numa pescadinha de rabo na boca e sem dinheiro para a comer.

Pedro Faria
Sobre o/a autor(a)

Pedro Faria

Dirigente do Sindicato dos Trabalhadores da Saúde, Solidariedade e Segurança Social (STSSSS). Dirigente do Bloco de Esquerda.
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