Zangam-se os canalhas, sabem-se as verdades!

porAugusto Taveira

27 de junho 2023 - 23:59
PARTILHAR

As diabruras de Prigozhin tiveram o condão de deixar à mostra as fragilidades e fissuras de um regime autocrático. Provavelmente, Putin ficou a ganhar, pelo menos por agora.

O crédito de Prigozhin é o de quem dá o dito por não dito e a seguir faz o mesmo ao que acabou de dizer, consoante a conveniência do momento. O crédito de Prigozhin é o de um tipo que se atreve a cuspir no prato, no caso concreto, a denunciar a alta corrupção, depois de ter subido à conta dela.

Prigozhin sabia da missa mais do que a metade. Com todo o conhecimento que agora revela sobre as mentiras que “justificaram” a invasão da Ucrânia, não hesitou em assumir o trabalho mais sujo da cruzada putinista, que o mesmo foi ordenar todas as atrocidades dos Wagner – de que se gabou –, ao arrepio das convenções internacionais, que até à guerra impõem regras.

Não é por Prigozhin ter dito a verdade sobre a guerra, que passa a ser um poço de bondade. Só lhe falta o ar de menino de coro acabado de sair da missa... Canalha!

Depois do “negócio” com Lukashenko, supervisionado por Putin, em jeito de “Agarra-me que eu mato-o!”, Prigozhin não teve outro remédio se não “meter a viola no saco”. Com a certeza de se ver temporariamente afastado do grande banquete, ao lado de Putin e dos oligarcas “bem-comportados”.

Ainda assim, naturalmente, não vai faltar nada a Prigozhin. Não vai ser preciso dedicar-se à cozinha, muito menos voltar aos assaltos a casas bem recheadas, ou à venda de cachorros quentes. Não obstante, depois da fantochada encenada contra “o padrinho” Putin, o chefão do grupo Wagner tem os dias contados. O mais certo...

As diabruras de Prigozhin tiveram o condão de deixar à mostra as fragilidades e fissuras de um regime autocrático. Provavelmente, Putin ficou a ganhar, pelo menos por agora, dado que a presente insurreição está nos antípodas de uma alternativa democrática, com a preocupação séria pelo bem-estar do povo russo, em harmonia com os povos vizinhos.

Conclusão: infelizmente, a leste, pode acontecer pouco ou nada de novo, concretamente, no que respeita à guerra na Ucrânia.

 

Por julgar que continua atual, segue a intervenção que tinha preparado para a XIII Convenção do Bloco de Esquerda, mas que, alegadamente por falta de tempo – julgo –, não me foi dada a oportunidade de ler.

XIII Convenção do Bloco de Esquerda

Camaradas, neste dia 28 de maio, que já foi de má memória, saúdo a XIII Convenção do Bloco de Esquerda. Lembro as e os mais novos de que não estaríamos aqui se o 28 de maio não tivesse sido derrotado pelo 25 de Abril.

De todo, não podia começar sem deixar de expressar um “muito obrigado” à nossa Catarina… [e, na presente data, desejar os maiores êxitos à nossa Mariana...]

Do que me lembro, sempre fui pacifista, com exceção dos casos considerados “guerras justas”, como sejam as guerras de libertação.

As minhas primeiras manifestações de pacifismo remontam ao tempo da guerra do Vietnam.

Na altura, quando não se podia gritar, não fosse o grito interpretado como manifestação contra a “nossa” guerra colonial, gritámos Make Love Not War.

Desde essa altura, temos tido, infelizmente, necessidade de cantar demasiadas vezes Give Peace a Chance...

Talvez não erre se disser que o pacifismo tem servido, objetivamente, para defender os David contra os Golias, ou seja, para defender os povos agredidos pelo imperialismo.

Por conseguinte, seria de esperar movimentos pacifistas contra a invasão da Ucrânia, tendo, como condição primeira para a paz, a condenação e a exigência de retirada do invasor.

Como seria também de esperar, o pacifismo é seriamente reprimido na Rússia de Putin.

Sucede que uma parte das teses pacifistas que estão em cima da mesa se resumem a, como dizem, não alimentar a guerra, o que, objetivamente, no caso presente, se traduz em abandonar os ucranianos, deixá-los à sua sorte, entregues a si próprios, que o mesmo é advogar o capitulacionismo de um povo que já mostrou, à saciedade, o anseio por continuar a ser independente.

O “inocente” aproveitamento do imperialismo americano – e da NATO para expandir-se ainda mais – não serve para inverter a realidade, a ponto de sustentar-se, como já li, que foram os Estados Unidos que atacaram a Rússia.

A oposição ao imperialismo americano, na minha opinião, não deveria relativizar as atrocidades e os vis atentados aos direitos humanos, muito menos transformar-se em cegueira, como aconteceu muitas vezes com o assobiar para o lado de alguns aquando do retrocesso civilizacional até ao grau zero da barbárie, perpetrado pelo fascismo islâmico.

A bandeira dos direitos humanos deve a Esquerda erguê-la. À Esquerda não cabe aceitar que o sacrifício dos povos seja decidido no tabuleiro da geoestratégia. Em pleno século XXI, não se justifica a conquista de território com recurso à guerra, com manifesto desrespeito pela Carta das Nações Unidas. Seja para Israel, seja para a Federação Russa, seja para outros por esse mundo fora…

Para que algum deste “pacifismo” fosse levado a sério, a ênfase teria naturalmente de ser dada à condenação da invasão por parte de Putin.

“Social-imperialismo” e “social-fascismo” foram expressões que caíram em desuso após o colapso da União Soviética. A pergunta é se, no caso presente, não deveriam recomeçar a ser usadas, naturalmente, com a dispensa do adjetivo “social”...

Contra todos os imperialismos, como muito bem disse, a Catarina! Levar o país a sério… todos os países,… somos internacionalistas!

Augusto Taveira
Sobre o/a autor(a)

Augusto Taveira

Professor aposentado
Termos relacionados: