António Sousa Pereira, reitor da Universidade do Porto, declarou ao Expresso que sofreu pressões de várias pessoas “influentes e com acesso ao poder” para que deixasse entrar 30 candidatos em Medicina, apesar destes não terem alcançado a classificação mínima (14 valores) na prova de conhecimentos do concurso especial de acesso para licenciados noutras áreas.
O responsável académico explicou ainda que Fernando Alexandre, o ministro da Educação, lhe ligou procurando que se criassem vagas extraordinárias para estes candidatos. “O ministro gostaria que isso fosse feito, mas eu disse-lhe: ‘Eu não o faço. Eu cumpro a lei. Se o senhor ministro entende que deve ser de outra maneira, dê-me a ordem e eu executo-a’”, revela.
O próprio ministro confirmou a conversa ao semanário, afirmando que “durante o telefonema foi manifestada a disponibilidade para a criação de vagas supranumerárias, desde que, para o efeito, existisse base legal”.
Explica-se que, para o ano 2025/26, a Faculdade de Medicina da Universidade do Porto tinha aberto 37 vagas. Concorreram perto de 50 candidatos mas só sete alcançaram o mínimo de 14 valores na prova que ocorreu em maio passado.
Depois disso, a comissão de seleção do concurso, da qual fazem parte seis professores daquela faculdade, decidiu “propor a aplicação excecional” de uma nota mínima mais baixa, 10 valores, o que faria com que as restantes 30 vagas fossem ocupadas, acabando por notificar os candidatos em causa que teriam entrado no curso. Fê-lo “sem informar o reitor da UP, a quem cabe a competência exclusiva de homologar os resultados definitivos”, escreve o Expresso.
Este recusou posteriormente recusou homologar a lista de colocados, considerando que “não se podem alterar as regras a meio de um concurso para fazer entrar candidatos que não cumprem os requisitos”.
Explica Sousa Pereira que os candidatos “protestaram das mais variadas formas” e que houve “muitas pressões, de muitos lados, no sentido de homologar a lista”. Algumas delas chegaram de “pessoas influentes, que têm acesso ao poder”, mas que o reitor não identifica.
Em agosto, o ministro da Educação falou com o reitor “porque estava muito incomodado com a situação”, continua este. “Eu disse-lhe que preferia ser obrigado pelo tribunal a abrir as vagas, se este entender que os candidatos têm realmente direito adquirido, a ir eu sentar-me no banco dos réus porque não cumpri a lei e admiti alunos em situação irregular.” Fernando Alexandre terá então sugerido que o reitor pedisse a intervenção da Inspeção-Geral da Educação e Ciência. Esta entidade concluiu “pela inadmissibilidade jurídica” da abertura desses lugares, “por ausência de base legal” e “pelo risco de violação dos princípios da legalidade, igualdade e segurança jurídica”.
O caso obrigou o ministro a emitir esta sexta-feira um comunicado onde garante que “nunca pressionou de forma alguma” o reitor a admitir “candidatos de forma irregular, nem sugeriu qualquer solução que violasse o enquadramento legal em vigor”, afirmando que a disponibilidade para criar as vagas para estes candidatos estava sujeita à existência de uma “base legal” para o efeito. Justifica a ideia com a “legítima expetativa” dos candidatos de entrarem no curso porque disso foram notificados.
Acusações graves que devem ser esclarecidas no Parlamento, diz o Bloco
Em reação ao sucedido, a dirigente bloquista Joana Mortágua escreveu nas suas redes sociais que “as acusações do reitor do Porto” sobre a pressão do ministro para admitir alunos no curso de Medicina “são graves”. E que “tudo deve ser esclarecido no Parlamento”.
Acrescenta ainda que “dificultar o acesso ao curso de medicina foi e é errado”, mas que isso “não se corrige com jeitinhos e irregularidades”.
As acusações do reitor do Porto sobre pressão do ministro para admitir alunos no curso de medicina são graves. Dificultar o acesso ao curso de medicina foi e é errado, mas não se corrige com jeitinhos e irregularidades. Tudo deve ser esclarecido no Parlamento.
— Joana Mortágua (@JoanaMortagua) September 5, 2025