Rússia multa acesso a conteúdos “extremistas”, Ucrânia dificulta investigação de corrupção

23 de julho 2025 - 12:57

Enquanto os países iniciam nova ronda negocial, internamente aprovaram leis que são postas em causa. Na Rússia várias pessoas foram presas quando exigiam um país sem censura. Na Ucrânia, milhares saíram às ruas depois do presidente ter promulgado lei que coloca em causa independência de agências de investigação de corrupção.

PARTILHAR
Manifestação esta terça-feira em Kiev.
Manifestação esta terça-feira em Kiev. Foto divulgada na rede social X

No dia em que está marcada uma ronda negocial entre Rússia e Ucrânia em Istambul, outras notícias chegam do interior de cada um destes países para além das atualizações sobre a invasão.

Na Ucrânia, houve manifestações contra a aprovação no parlamento e promulgação por parte do presidente Zelensky, esta terça-feira, de uma lei que acaba com a independência do gabinete nacional anti-corrupção, conhecido como Nabu, e do gabinete especializado do procurador para o combate à corrupção, o Sap.

Os críticos afirmam que o Procurador-geral, Ruslan Kravchenko, próximo de Zelensky, passa a acumular demasiados poderes sobre estas instâncias e o governo terá agora mais condições de controlar os casos que serão investigados ou não, aumentando a interferência polícia. Kravchenko passa a poder, por exemplo, escolher atribuir determinados aos investigadores que lhe são favoráveis.

Depois dos protestos, num vídeo lançado já depois da meia-noite, Zelensky afirmou ter conversado com Semen Kryvonos, chefe da Nabu, e outros procuradores anti-corrupção, justificando-se que estes organismos continuarão a funcionar “mas sem nenhuma influência russa” que “deve ser toda limpa”.

Ao mesmo tempo, criticou a lentidão e ineficácia de ambas as instâncias: “não há explicação racional para o porquê de procedimentos criminais no valor de biliões estarem pendentes durante anos”, acrescentando que, a partir de agora, o seu procurador geral iria assegurar “a inevitabilidade da punição” para os criminosos.

Segundo as agências noticiosas, foram “vários milhares” as pessoas que saíram às ruas da capital, junto ao complexo presidencial, de um país em guerra e a sofrer constantes ataques aéreos para exigir que o chefe de Estado vetasse a lei, gritando “vergonha” e empunhando cartazes em que se podia ler “escolhemos a Europa, não a autocracia”. Há notícias de manifestações noutras cidades como Dnipro, Lviv and Odesa. Trata-se dos maiores protestos desde que a Rússia começou a invasão em larga escala da Ucrânia em fevereiro de 2022.

As críticas vieram ainda de reconhecidos soldados e figuras da sociedade civil e dos meios de comunicação social. Do lado político, Dmytro Kuleba, que se demitiu de ministro dos Negócios Estrangeiros o ano passado, afirmou ser um “mau dia para a Ucrânia”, considerando que o presidente tinha feito uma escolha entre estar do lado do povo ou não.

Externamente, a União Europeia, à qual a Ucrânia pretende aderir, também expressou rejeição da lei. A comissária europeia para o alargamento, Marta Kos, declarou nas suas redes que “o desmantelamento de salvaguardas chave que protegiam a independência do Nabu é um sério passo atrás”. Vincou igualmente que os dois organismos atingidos pela legislação são “essenciais” para o caminho da Ucrânia em direção à União Europeia.

Guillaume Mercier, porta-voz da Comissão Europeia, foi mais longe, lembrando, para além da preocupação com as recentes ações do governo ucraniano, que “a União Europeia providencia assistência financeira significativa à Ucrânia, condicional relativamente aos seus progressos sobre transparência, reforma judicial e governança democrática.

Recorde-se que na véspera da adoção da lei, os serviços de segurança da Ucrânia e o gabinete do procurador geral desencadearam rusgas e fizeram detenções de alegados “espiões russos” na Nabu.

O ramo ucraniano da organização Transparência Internacional considerou que estas intervenções foram ilegais e “procuraram obter à força informações e influenciar as investigações desencadeadas sobre altos responsáveis” do regime. Vários meios de comunicação social locais ligaram as buscas a uma iminente acusação do ex-ministro da Unidade Nacional. Oleksiï Tchernychov, e a inquéritos sobre a ex-ministra da Justiça, Olga Stefanichina.

Na Rússia vai-se multar quem procurar “conteúdo extremista” na Internet

Na Rússia também houve protestos contra uma lei aprovada esta terça-feira. Mas de dimensão bem menor, dada a onda de repressão, e terminando com a detenção de vários ativistas e de pelo menos dois jornalistas. Havia cartazes a dizer “Por uma Rússia sem censura”.

Estes protestavam contra a lei que prevê a aplicação de multas apenas por procurar na Internet conteúdo que as autoridades tenham rotulado como “extremista”. Esta foi aprovada esmagadoramente na Duma, a Câmara Baixa do parlamento russo, com 306 votos a favor e 67 contra. O porta-voz desta disse que a lei era contra “aqueles que estão a tentar destruir e arruinar a Rússia utilizando a Internet”.

O Ministério da Justiça do país criou uma lista do que considera ser este “material extremista”. Trata-se de um documento de mais de 500 páginas com mais de 5.000 entradas com conteúdo que vai desde os elogios à Ucrânia até às publicações da banda feminista Pussy Riot. O regime de Putin considera também, por exemplo, o “movimento internacional LGBT” como extremista.

O acesso a qualquer um dos sites que façam parte da lista passa a ser implicar multas de até 5.000 rublos. Também se procura atacar formas seguras de chegar a este tipo de conteúdos e de não ser monitorizado. A publicidade a serviços VPN têm coimas entre os 50.000 a 500.000 rublos, estando estes sujeitos a multas se permitirem acesso a páginas que estejam bloqueadas.

As autoridades poderão solicitar os os dados de navegação dos utilizadores a motores de busca, empresas de prestação de serviços de Internet e os operadores de telemóveis.

Termos relacionados: InternacionalRússiaUcrânia