A Comissão Europeia e os governos europeus foram os primeiros a saudar o anúncio do plano que Donald Trump apresentou na Casa Branca a Benjamin Netanyahu, obtendo assentimento do primeiro-ministro que é alvo de um mandado de detenção do Tribunal Penal Internacional para ser julgado por crimes de guerra e contra a humanidade. Pressionados pelas opiniões públicas dos seus países a deixarem de olhar para o outro lado quando ocorre um genocídio na Faixa de Gaza, governos como o da Itália viram no anunciado plano uma oportunidade para tentar retirar força ao movimento que exige sanções a Israel, inclusive apelando à flotilha humanitária para dar meia volta, pois o plano garantiria acesso completo à ajuda humanitária. Também a UEFA aproveitou o anúncio de Trump para adiar indefinidamente a decisão sobre a exclusão das equipas israelitas das provas internacionais de futebol.
Dentro da flotilha, Mariana Mortágua criticou o plano de paz apresentado por Trump e aplaudido pelos governos europeus. "Com este acordo, Gaza será um território com livre circulação para o ocupante e autoridade colonial sob comando de um criminoso de guerra encartado, Tony Blair. Gaza precisa de paz, reconstrução e democracia. Deve ser a ONU - não Netanyahu e Trump - a garantir esse resultado", afirmou a coordenadora do Bloco nas redes sociais.
Na esquerda britânica, Jeremy Corbyn foi dos primeiros a considerar o plano de Trump como “mais uma iniciativa colonial”, por ter sido feito a pensar nos seus interesses, nos interesses militares e nos interesses de Israel. “Os únicos interesses em que não pensaram foram os do povo palestiniano”, afirmou o ex-líder dos trabalhistas que está a formar um novo partido.
Corbyn critica também o papel do antigo primeiro-ministro Tony Blair no processo, lembrando a sua intervenção na guerra do Iraque que matou centenas de milhares de pessoas, sem que alguma vez tenha pedido desculpas. “Blair não devia poder aproximar-se de Gaza. A ideia de um vice-rei nomeado para governar Gaza, como se os palestinianos não pudessem governá-la, é absurda, é a mentalidade do Mandato da Palestina dos anos 1920”.
Para Jeremy Corbyn, o que é preciso é “parar o envio de armas para Israel, conseguir um cessar-fogo, tirar as tropas israelitas de Gaza, apoiar o povo palestiniano na reconstrução da sua sociedade. Não são precisos os conselhos de Tony Blair para fazer isto”.
As críticas ao papel de Tony Blair no processo são comuns nas reações da esquerda. O antigo ministro das Finanças grego e fundador do DIEM25, Yanis Varoufakis, diz que “ele propõe-se a si mesmo como o Regente do Império em Gaza. Sendo ele próprio um criminoso de guerra, exige uma nomeação de cinco anos para gerir a zona do genocídio israelita em nome de Donald Trump na melhor tradição dos projetos do colonialismo branco”.
O escritor e editor da New Left Review Tariq Ali descreve o acordo como “um novo pacto de segurança para preparar um novo Estado fantoche na Palestina”, juntando “o melhor manipulador de eleições (na descrição de Trump) Erdogan, o príncipe herdeiro saudita, ditadores militares do Paquistão e do Egito, etc”., todos curvados face “ao governante imperial”. “Vergonhoso. Um governo imposto e um governador subcolonial (Blair). Quanto tempo isso vai durar? Um ou dois anos?”, questiona Tariq Ali.
Ainda no Reino Unido, o colunista Owen Jones - que acaba de ser expulso da Conferência do Partido Trabalhista por entrevistar os deputados pró-israelitas presentes - também concorda que este plano é “na verdade um ultimato” que destina Gaza a ser uma colónia ocidental liderada por Trump. Por outro lado, ao afirmar que após a aceitação do acordo por parte do Hamas a ajuda humanitária será entregue de imediato, Owen Jones diz que o documento confirma que “Israel está a impedir de forma sistemática a entrada da ajuda em Gaza de forma a espalhar a fome entre o seu povo e depois ainda mente sobre isso”.
Na Alemanha, a presidente do Die Linke, Ines Scwerdtner, afirma que “o plano de Trump não é um plano de paz, mas sim fantasias irrealistas de poder absoluto. A paz só pode ser alcançada com o povo palestiniano”.
Outra reação veio da Colômbia, onde o Presidente Gustavo Petro ficou a saber que lhe cancelaram o visto de entrada nos EUA após ter participado há dias numa manifestação em Nova Iorque de solidariedade com a Palestina, durante a sua ida à Assembleia Geral da ONU. Para o Presidente colombiano, “o plano de paz é cumprir com a justiça internacional. Primeiro passo: permitir a alimentação ao povo de Gaza e parar o bombardeamento de civis”.
Em Espanha, Pedro Sánchez saúda acordo, Sumar e Podemos contestam
Na esquerda espanhola, o Podemos, pela voz da sua líder Ione Belarra, juntou-se aos que consideram o plano de Trump um ”Plano de colonização 2.0 para a Palestina”. Lembrando que “Trump propôs transformar Gaza num resort de luxo e é tão responsável como Netanyahu pelo genocídio”, a líder do Podemos critica os governos europeus, incluindo o espanhol, que saudaram esta iniciativa como se fosse uma boa ideia para o futuro dos palestinianos. “Recusamos esta proposta que só vem consolidar a colonização e o apartheid a que o povo da Palestina está submetido há décadas. Ela tem por único objetivo calar as críticas da mobilização social e que em todo o mundo condenam durante os crimes de guerra cometidos por Netanyahu”.
Mas apesar da saudação de Pedro Sánchez, o plano de Trump abre mais uma brecha no interior do Governo, com a ministra Yolanda Díaz, do Sumar, a considerá-lo “uma imposição e um ultimato disfarçado de acordo sem horizonte para um Estado palestiniano”. Além de excluir as instituições e o povo da Palestina, o plano quer “converter Gaza num protetorado tutelado pelos EUA com Israel a marcar cada passo”. Para a ministra espanhola, “isto não é paz, é perpetuar a ocupação”, pelo que “não podemos aceitar esta farsa”. Para sair do impasse, propõe um cessar-fogo imediato, a entrada de ajuda humanitária sob os auspícios da ONU e um calendário vinculativo para o reconhecimento pleno da Palestina como Estado soberano”.