A chuva que se abateu sobre Lisboa não impediu mais de uma centena de pessoas de participar esta terça-feira ao fim da tarde numa manifestação de bicicleta contra a destruição da ciclovia da Avenida de Berna, percorrendo o percurso ameaçado pela autarquia.
Com a justificação de que a ciclovia construída em 2020, durante a pandemia, tem erros conceptuais, a Câmara de Lisboa tinha anunciado a sua anulação, obrigando a que a circulação de bicicletas entre a Praça de Espanha e a Avenida da República se faça por um corredor partilhado com automóveis na Avenida Elias Garcia. Ao anúncio da Câmara respondeu uma petição contra a destruição da ciclovia que reuniu mais de mil assinaturas.
Esta semana, sem ouvir a vereação e ignorando a petição entregue à Assembleia Municipal, a Câmara avançou com o desmantelamento da ciclovia unidirecional no lado norte da Avenida de Berna em toda a sua extensão e no lado sul entre o Largo Azeredo Perdigão e a Avenida da República. Ou seja, 85% da ciclovia será destruída, deixando de servir os estudantes da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, ali situada. No lugar da ciclovia serão repostos 70 lugares de estacionamento, com a Câmara a prometer tratar-se de uma situação provisória até que a EMEL e a autarquia encontrem uma solução definitiva.
Para a vereadora do Bloco de Esquerda, "é falso que exista alternativa à destruição da ciclovia da Av. de Berna, visto que as vias projetadas são partilhadas com automóveis, são no interior dos bairros, com muito mais intersecções e sinais, o que torna esse caminho muito mais inseguro, havendo mesmo um troço sem ciclovia ou via partilhada". Beatriz Gomes Dias lembra ainda que a decisão avança sem serem conhecidos os resultados da auditoria prometida por Carlos Moedas às ciclovias de Lisboa.
Num requerimento dirigido ao presidente da Câmara, a vereadora bloquista quer explicações sobre a justificação técnica para a destruição da ciclovia, as razões para a ausência de consulta pública, o impacto estimado para a qualidade do ar e poluição sonora e como é que esta destruição se compatibiliza com os compromissos de mobilidade sustentável e de redução da poluição do ar.
Para Beatriz Gomes Dias, esta decisão de Moedas "avança em contra corrente com as outras capitais europeias e, em vez de construir mais ciclovias, destrói as poucas que existem em Lisboa".
Ativistas "perplexos" com decisão que contraria caminho para a neutralidade carbónica
Giulia Gallorini, da Massa Crítica, uma das organizadoras do protesto desta terça-feira, disse ao Público que “Lisboa está muito atrasada em relação a outras cidades europeias, no que se refere às questões da mobilidade. Em 2023, sabendo o que sabemos sobre os efeitos da poluição na saúde das pessoas e tendo em conta o que está em jogo com as alterações climáticas, torna-se incompreensível uma decisão destas”.
Também Herculano Rebordão, coordenador da secção de Lisboa da MUBi - Associação pela Mobilidade Urbana em Bicicleta, diz que “ficamos perplexos, quando a câmara anuncia a neutralidade carbónica até 2030, mas depois promove a utilização do automóvel. Fazer isto é privar as pessoas de terem uma ligação directa entre a Praça de Espanha e a ciclovia da Avenida da República, que é uma ligação estrutural na cidade”. O ativista reconhece que “aquela ciclovia precisa, de facto, de ser melhorada em alguns aspetos. Mas não eliminada. Quando uma rua tem problemas, há que corrigi-los, não se elimina a rua”, critica.