O negócio do genocídio

Como os bancos e seguradoras internacionais financiam o genocídio em Gaza

06 de outubro 2025 - 14:53

As obrigações emitidas por Israel têm “um papel crucial no financiamento do ataque em curso a Gaza”, tinha já concluído a Relatora Especial da ONU sobre a situação dos direitos humanos nos territórios palestinianos. A Allianz e sete grandes bancos europeus e dos EUA estão a comprar ou a garantir milhares de milhões de dólares destes títulos.

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Montagem da página do Follow the money sobre os títulos de Israel.
Montagem da página do Follow the money sobre os títulos de Israel.

“Israel está em guerra: estamos com Israel”. É com este slogan bastante explícito são comercializadas as obrigações do Estado israelita. Uma investigação do Follow the Money, um órgão de comunicação social que, como o nome indica, se dedica a rastrear os negócios que envolvem empresas, “decisores políticos, atores influentes ou figuras obscuras dos bastidores”, revela esta segunda-feira que grandes seguradoras e bancos europeus e norte-americanos estão a investir ou a garantir estas obrigações. E elas “estão a revelar-se vitais para o financiamento da guerra em Gaza”.

Os títulos israelitas são comercializados pela Israel Bonds, uma empresa afiliada ao governo, e o seu número disparou nos últimos dois anos. Em 2023 e 2024, Israel emitiu dívida no valor de 23,5 mil milhões de dólares. Entre 2014 a 2022, o valor médio comparável foi cerca de 75% inferior.

O grupo de investigação financeira Profundo descobriu que a alemã Allianz, através da sua subsidiária PIMCO, é o maior comprador destas obrigações com 960 milhões de dólares investidos e que há sete grandes bancos a atuar como intermediários e a subscrever títulos: quatro norte-americanos, incluindo o Goldman Sachs e o Bank of America, três europeus: o Deutsche Bank da Alemanha, o BNP Paribas de França e o Barclays do Reino Unido.

Os especialistas ouvidos pela investigação avançam que estas empresas podem estar a violar as orientações corporativas sobre direitos humanos. Estas não são juridicamente vinculativas para as empresas mas os governos que as assinaram têm obrigação de garantir que sejam implementadas e seguidas. Tara Van Ho, professora associada de Direito na Universidade St. Mary, no Texas, sublinha que “praticamente qualquer pessoa que tenha avaliado de forma independente a situação em Israel vê não só violações dos direitos humanos, mas também crimes de guerra, crimes contra a humanidade e genocídio”. Pelo que “se as empresas com conhecimento destas questões continuarem as suas atividades mesmo assim, sabendo que não têm qualquer influência nas escolhas de Israel, isso é uma violação flagrante das suas responsabilidades em matéria de direitos humanos”.

Francesca Albanese, Relatora Especial da ONU sobre a situação dos direitos humanos nos territórios palestinianos, já em julho tinha produzido um relatório que concluía que os títulos de Israel desempenharam “um papel crucial no financiamento do ataque em curso a Gaza”.

Das instituições contactadas pelo Follow the Money, a Allianz respondeu genericamente a dizer que as suas decisões de negócio  cumprem as leis nacionais e internacionais, enquanto o BNP Paribas, que subscreveu dois mil milhões de dólares em obrigações isralitas, diz nunca ter investido ou financiado as obrigaões e que o seu “papel de intermediário já terminou”. O Citigroup e o Deutsche Bank recusaram-se a responder e o Bank of America, Barclays, Goldman Sachs and JPMorgan Chase não enviaram nenhuma resposta.

O papel dos bancos centrais da União Europeia

Estes títulos só podem ser vendidos na União Europeia a partir da aprovação de um banco central da comunidade. Antes de 2021, cabia ao banco nacional do Reino Unido este papel. O Brexit resultou na passagem de testemunho para banco central da Irlanda.

Mas as críticas que se desencadearam no país empurraram a responsabilidade para o banco central do Luxemburgo. A mudança causou também protestos neste país, com a oposição a acusar o regulador financeiro de violar direito internacional e a colocar o país na posição de cúmplice de crimes de guerra e genocídio.