Missão humanitária

Nova flotilha a caminho de Gaza desafia o bloqueio israelita

07 de outubro 2025 - 16:32

A nova flotilha zarpou um dia depois de as forças navais israelitas terem atacado e apreendido os mais de 40 barcos da Global Sumud Flotilla, Entre os onze navios está o Conscience, que transporta 90 participantes, incluindo pessoal médico e jornalistas de 26 países.

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nova flotilha
Nova flotiha partiu um dia depois do assalto israelita aos barcos da Gobal Sumud Flotilla. Foto A Thousand Madleens

Uma nova flotilha de 11 navios está a caminho de Gaza com o objetivo de romper o bloqueio naval e marítimo imposto por Israel. Esta missão inclui o maior navio que alguma vez integrou as flotilhas, o Conscience, que transporta entre os seus passageiros pessoal médico internacional, ativistas de direitos humanos e jornalistas.

O grupo de embarcações com bandeiras de diversos países é organizado pela Freedom Flotilla Coalition (FFC) e pelo movimento Thousand Madleens to Gaza e cerca de 170 pessoas encontram-se a bordo dos 11 barcos do comboio marítimo.

Composição e objetivos da missão

Esta segunda vaga, inicialmente composta por oito barcos, foi posteriormente aumentada pela integração do Conscience, uma missão separada e que  constitui o maior navio a participar na frota até ao momento. No sábado o Comité Internacional para Quebrar o Cerco a Gaza anunciou que outros dois barcos (o Ghassan Kanafani e o al-Awda) se haviam juntado a esta vaga para desafiar o bloqueio de Israel a Gaza, elevando o número total de embarcações para 11. A frota já passou pela ilha grega de Creta e está agora posicionada a norte de Alexandria, no Egito, a caminho de Gaza, como se pode ver em direto no tracker proporcionado pela organização.

O navio Conscience, que já foi bombardeado por Israel ao largo da costa de Malta em maio de 2025, está de regresso ao mar para transportar médicos, jornalistas, ativistas humanitários e bens essenciais para ajudar a população cercada de Gaza, nomeadamente o pessoal médico e jornalistas.

A missão tem uma natureza simultaneamente simbólica e humanitária: desafiar o bloqueio, afirmar o direito de levar ajuda e chamar a atenção para as condições de vida dos civis em Gaza.  O Conscience é também apelidado de “Navio dos Médicos e Jornalistas”, sublinhando um claro objetivo de assistência médica e registo jornalístico. As declarações públicas destacam que muitos dos que seguem a bordo transportam material médico, equipamentos de comunicação e mensagens de solidariedade.

Ao longo destes dois anos de genocídio em Gaza Israel já assassinou mais de 1700 profissionais de saúde (uma média de cerca de 70 por mês ou mais de 2 por dia), ao mesmo tempo que executou sistemática, metódica e planeadamente a destruição do sistema de saúde de Gaza: todos os hospitais de Gaza foram total ou parcialmente destruídos e os profissionais de saúde sobreviventes estão muito diminuídos na sua capacidade de ajudar os feridos devido à exaustão, fome, falta de condições mínimas de vida, com muitos a dormir em tendas, escombros ou na rua. Israel prendeu ainda mais de 300 profissionais de saúde, submetendo-os a tortura e maus-tratos e continuando muito deles desaparecidos até à data.

Por outro lado, desde o início do genocídio Israel não permitiu a entrada em Gaza de equipas de jornalistas internacionais e independentes, dedicando-se afincadamente a eliminar deliberadamente os jornalistas palestinianos de Gaza, bem como as suas famílias, recorrendo inclusivamente a tecnologias de inteligência artificial para localizar os alvos. São já mais de 270 os jornalistas assassinados por Israel enquanto muitos outros foram detidos e se encontram em paradeiro desconhecido.

«Como jornalistas e profissionais médicos, temos a responsabilidade de dizer a verdade e preservar a vida», afirmou o Dr. Ricardo Corradini, cirurgião geral italiano, num comunicado. «Esta missão é um apelo aos nossos colegas — e às instituições que nos representam globalmente — para que quebrem o silêncio, defendam a sua ética e se posicionem do lado certo da história».

«Os cidadãos agem quando os governos falham. Na ausência de ação, a humanidade torna-se resistência», dizem os organizadores do Thousands Madleen. A deputada espanhola na Assembleia de Madrid, Jimena González, membro da frota, defende esta missão humanitária marítima pela falta de intervenção dos Estados para «quebrar» o bloqueio da faixa palestiniana, «que é ilegal». «Se os Estados abrissem um corredor humanitário, amanhã daríamos meia volta», disse a deputada do Más Madrid em declarações à EFE a partir de um dos veleiros que partiu há uma semana de Itália.

Incertezas e certezas

Devido às diferenças de velocidade entre os navios, a flotilha teve de abrandar em certos pontos para que as embarcações mais lentas não ficassem para trás. Mantém-se incerto o momento em que as forças navais israelitas irão intercetar este grupo, mas é conhecido que as flotilhas anteriores foram abordadas em águas internacionais. A maior flotilha (a Global Sumud Flotilla) foi intercetada há dias, com todos os navios apreendidos e os ativistas detidos.

Na madrugada de sexta-feira passada, a FFC anunciou que o Marinette, o último barco remanescente da Global Sumud Flotilla, havia sido intercetado aproximadamente a 42,5 milhas náuticas de Gaza. Um porta-voz disse, na altura “esta não é a conclusão da nossa missão. A nossa determinação em enfrentar as atrocidades de Israel e apoiar o povo palestino permanece inabalável. (…) Não vamos parar até que o genocídio termine. Não vamos parar até que a Palestina seja livre.”

Os organizadores deste novo comboio marítimo acrescentaram que já estão em andamento os preparativos no sul da França para lançar a próxima frota em novembro.

O bloqueio ilegal israelita a Gaza

Os bloqueios com diferentes níveis de intensidade impostos por Israel à Faixa de Gaza datam do início da década de 1990 e intensificaram-se significativamente em 2007, quando Israel impôs um bloqueio total à entrada e saída de bens e pessoas de Gaza, a partir do momento em que o Hamas venceu as eleições na Faixa. No mesmo ano, o Egito fechou a passagem de Rafah, na fronteira com Gaza.

A primeira missão da Freedom Flotilla, na altura organizada pela ONG Free Gaza, teve lugar em 2010, com uma frota de seis barcos, que transportava mais de 700 pessoas e 10 mil toneladas de ajuda humanitária para Gaza, tentando furar o bloqueio. O navio Mavi Marmara foi atacado pelas Israel em águas internacionais do Mar Mediterrâneo, tendo as forças israelitas assassinado pelo menos 9 ativistas internacionais.

Nada disso impediu o movimento das Flotilhas que continuou ao longo destas mais de duas décadas a tentar quebrar esse bloqueio ilegal israelita e levar ajuda humanitária à população de Gaza. E, certamente, a esta seguir-se-ão outras. Como o movimento das marés, que nunca pára, com ondas atrás de ondas, assim é o movimento das flotilhas: intercetável mas imparável.